sábado, 9 de maio de 2015

Sítio arqueológico Alcobaça

Localizado na zona rural do município de Buíque, o sítio arqueológico Alcobaça impressiona a comunidade científica brasileira e até mesmo internacional por sua enorme concentração de registros rupestres, sobretudo pinturas. O sítio recebe este nome pela sua localização rural homônima, o acesso ao mesmo é por meio da Vila Carneiros, situada há doze quilômetros da cidade de Buique, no sentido Arcoverde – Buique, contudo, os turistas e estudiosos ainda percorrem seis quilômetros de estrada de terra até a residência da guia e protetora do sítio, Cida. Mas não pára por aí, após estacionar os veículos, todos devem realizar uma caminhada de mais ou menos quarenta minutos sobre um solo muito arenoso. O sítio é

Situado em um pé de monte, num vale fechado em forma de U a 800 metros sobre o nível do mar, tem um olho d’água perene situado a menos de 50 metrosdo abrigo. Com aproximadamente 50 metros de comprimento e 14 de largura, no ponto mais amplo, e uma altura de 8 a 10 metros, apresenta as paredes cobertas em grande parte, por grafismos puros e alguns antropomorfos típicos da tradição agreste. (MARTIN, 2005)

O local onde se encontram os painéis com pinturas rupestres é um enorme abrigo sob rocha, na verdade é um afloramento ou formação rochosa arenítica, denominada de matacão, com sulcos na base que proporcionam uma enorme proteção dos fortes raios solares daquela região. O sítio alcobaça é considerado o segundo maior sítio arqueológico com concentrações de pinturas rupestre do Brasil, perdendo apenas para o abrigo sob rocha Boqueirão da Pedra Furada de São Raimundo Nonato, Piauí. No sítio existem grafismos rupestres (pinturas e gravuras) decorados por mais de 50 metros do painel, inclusive, algumas pinturas encontram-se numa elevação de 08 a 10 metros do solo do abrigo.


As pinturas estão classificas na Tradição Agreste, que compreende uma prática estilística comum na região agreste do Estado de Pernambuco, por isso sua definição. A tradição agreste é muito complexa e de difícil interpretação, podemos até inferir que são as pinturas rupestres mais enigmáticas e incompreensíveis da pré-história brasileira. Nesta tradição é comum a representação de antropomorfos, zoomorfos e fitomorfos (seres humanos, animais e vegetais) de maneira estática, sem movimento, além dos grafismos puros, denominação da arqueóloga Anne Marie-Pessis do Departamento de Arqueologia da Universidade Federal de Pernambuco, que consiste na reprodução de espirais, grades, bastões, nuvens de pontos, tridáctilos, linhas paralelas e sinuosas, sobretudo, representações geométricas. Estes sem dúvidas são os grafismos mais difíceis de interpretação, jamais se pode afirmar com segurança o que aqueles povos pré-históricos queriam reproduzir com seus grafismos. Vale salientar que os grafismos puros são encontrados com freqüência em todo o Nordeste do Brasil e igualmente em alguns sítios do restante do nosso país e noutros países também.


Para os arqueólogos fica muito difícil até mesmo inferir e supor sobre a intencionalidade, funcionalidade e representatividade destes grafismos, sobretudo, porque não podemos associar as pinturas geométricas com os nossos conceitos contemporâneos. Ademais, os autores dos grafismos do sítio alcobaça viviam num tempo muito recuado do nosso e conferiam uma representatividade e interpretação de mundo muito distinta da nossa. Como diz a arqueóloga Niède Guidon, não temos o código lingüístico, tampouco simbólico daqueles povos pré-históricos, o que a arqueologia pode concluir, não passa de apenas algumas inferências.


Em toda a extensão do paredão decorado por pinturas rupestres são poucas as representações humanas e animais, mesmo assim existem alguns grafismos que lembram figuras de seres humanos, apesar de algumas com apenas três dedos. Os animais representados são sáurios (lagartos) e outros répteis que são abundantes no bioma da caatinga. Não há dúvidas de que os animais representados nos painéis pintados faziam parte da dieta daqueles povos pré-históricos, sobretudo, para grupos humanos caçadores-coletores. Estes povos consumiam mais alimentos vegetais que animais, isso ocorria pela dificuldade encontrada na caça com êxito de pequenos roedores, aves, répteis e insetos. Os vegetais mais consumidos eram coquinhos, raízes, tubérculos e frutos encontrados nas imediações.

O sítio, provavelmente, não servia de habitação visto que aqueles povos eram caçadores-coletores, agrupamentos humanos que exigiam uma grande mobilidade em busca de sua própria sobrevivência, quando os alimentos cessavam num determinado local estes povos buscavam outras fontes alimentares noutros lugares.

O sítio não foi ocupado apenas por um único agrupamento humano, mas por diversos e distintos povos pré-históricos. A arqueologia comprovou esta teoria a partir dos vários estilos pintados no sítio, variando os grafismos em cores, sobreposição, estilos e objetos representados. A cor predominante é a ocre (óxido de ferro) que é obtida a partir da hematita, mineral muito comum na região, o preparo dos pigmentos exigia muita habilidade. As técnicas de pinturas no sítio são várias, com os próprios dedos, com pincéis naturais (galhos) e bastões de ocre (lápis). Existem grafismos na cor amarela, branca e preta. Os amarelos são obtidos a partir da argila amarela e também por hematita, a cor branca é obtida pelo Kaolin (argila branca) e a cor preta por meio de carvões e ossos queimados.

Em escavações realizadas no local, foram descobertos sepultamentos humanos de alguns indivíduos, logo abaixo dos painéis pintados, onde estes estavam acompanhados por pigmentos vermelhos (ocre), coquinhos, utensílios cerâmicos, cestaria e revestidas por esteiras trançadas. Estes ritos fúnebres são comuns no Nordeste do Brasil.


No abrigo sob rocha vários blocos desprenderam-se da formação arenítica original caindo no solo, inclusive, alguns painéis de pinturas rupestres também sofreram descamação e caíram no terreno do abrigo. É muito difícil realizar datações radiocarbônicas das pinturas rupestres, contudo, as datações de muitos sítios arqueológicos com registros rupestres são obtidos a partir de blocos decorados deslocados (caídos) para o chão formando uma camada estratigráfica (sedimentos) que pode, eventualmente, ser datada a partir dos refugos de materiais orgânicos encontrados no mesmo nível que os blocos. O Alcobaça tem diversas datações radiocarbônicas 1.766 e 1.785 anos antes do presente. Mais outros indícios sugerem que o sítio foi ocupado inicialmente a 4 mil anos atrás.


No sítio também foram encontradas várias fogueiras espalhadas pelo abrigo o que indica uma ocupação intermitente daquele abrigo. As fogueiras serviam para aquecer os agrupamentos pré-históricos, assim também como proteção de animais selvagens e picadas de insetos.


O sítio alcobaça impressiona a todos que o visitam pela sua magnitude, pelo enorme conforto do abrigo que encobre os raios solares, pela sutileza e requinte dos registros rupestres da tradição agreste, somado a tudo isso, destaca-se pela sua preservação, sobretudo, pelos cuidados da guia Cida, que não permite a entrada no abrigo de mais de dez pessoas por vez e fica sempre atenta quando os turistas, estudantes e curiosos se aproximam demais para tocar nas pinturas rupestres. Sem dúvida é um local que merecer ser estudado e admirado por aqueles que se encantam com a pré-história e arte rupestre brasileira.